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setembro 03, 2014

O teatro

Os aplausos não vem...
Mesmo sendo uma peça de drama, toda e qualquer peça deveria ser aplaudida. 

Foi triste, eu sei, mas os aplausos deveriam vir.
Eles devem ter sentido isto também. O público, eu digo.
Afinal toda concentração deles estavam sobre mim.
Devem ter sentido minha dor de estar sozinho em um palco, com cordas atadas às costas, esperando um movimento sútil de uma mestra que se esconde sabe-se lá onde.

Congelado por mãos descuidadas, meu coração emite uma energia.
Uma energia que ultrapassa a barreira do som, melhor sentida do que vista.
Ate os cegos que não viram meus tristes olhos, ou os surdos que não puderam ouvir meus desesperados gritos, devem ter sentido.
E todos sabem. Mas não aplaudem...Ficam em silêncio, esperando algo mais.

- Ele vai reagir, não vai? Isso não pode ser o fim. - eu ouvi gritarem.

Eu tentava. Meu corpo não respondia. Minhas cordas não se mexem sozinhas.

“Você deve ter feito eles congelarem também. Com essas suas mãos desastrosas...” – penso eu em relação à mestra.

Eles querem aplaudir, afinal quem não gosta de uma peça dessas?
Tão emocionante...tão tocante.

Alguns choram, de emoção ou tristeza, mas nada de aplaudirem.
Minhas cordas não se movem não importa o quanto eu lute para me desvencilhar.

"Você acabou de me torturar? De me comandar?"
"Sua diversão acabou? Achou outro brinquedo para brincar?"

Sinto as cordas me liberar. Caiem junto com meu corpo ao chão.


"Ah, o doce chão novamente."

Com meus pés ainda impotentes, me movo devagar.
Como um bebê dando seus primeiros passos, mal consigo me mover do lugar.
Arranco suspiros da plateia; me fazem respirar.
Os aplausos veem. Não entendem o final, mas aplaudem.
Eu nem acho que deveriam aplaudir, pois para mim um poema é o desabafo triste de um coitado, sendo assim você não esta aplaudindo as suas belas palavras e sim sua triste alma; mas aplaudem.

Me sinto um novo ser. Todas aquelas pessoas me olhando esperando eu me erguer.
Torcendo para mim triunfar.
Mas...o que faço? Não sou mais controlado...Você era a dona; dona do show. Dona da vida.
O que faço agora com minhas cordas caídas?
Tantas pessoas na plateia para agradar, e sem nenhuma ideia para atuar.
Danço? Choro? Canto? Corro? Pulo? Morro?
O que faço agora sem você?

Alguém da plateia se levanta. É uma anja.
Ela reconhece minha dor, meu aflito.

"Ela vem pra me ajudar? Ou seria só mais uma controladora?"

Ela esta vindo em minha direção, não sei o que esperar.
Minha testa, agora livre, começa a suar.
Seu belo olhar diz "Venha cá, quero te amar"
Seu lindo vestido quase me convida a dançar.
Seu passo determinado me diz que ela não irá recuar.
Reparo que eu ainda estou no chão, apesar de minha alma estar nas alturas.
Ainda estatelado no chão, imóvel, vejo ela pisar no palco.
Ela pisa onde muitos temem pisar.

Ela se curva à minha frente.
Estende sua mão delicada, pegando minhas cordas.
Arrancando uma a uma, sutilmente sem nem machucar.

Então me envolve em suas assas e começo a chorar.
Sinto toda minha amargura, toda minha dor, toda a minha indefesa indo embora em forma de lindas e brilhosas lágrimas.
A plateia fica mais confusa do que aquele suposto final.

"O que aquela mulher esta a fazendo ajoelhada ali?"

Sem saber se isso foi combinado ou se foi mero atrevimento da parte dela.
Assim como eu não sabia se isso foi parte de um livro já planejado ou a vida mostrando a sua riqueza.
O cenário muda. Ao invés do vazio monologo que eu me encontrava, as coisas vão mudando.
Plantas começam a crescer e passarinhos a cantar. Um novo mundo veio a tona.

“Você esta seguro agora” - ela me sussurra.

Me sinto bem ao lado dela, sem me sentir controlado, sem se sentir um objeto. Apenas feliz.
A plateia observa e depois aplaudem, pois agora acabou de verdade.

Que bom que essa historia teve um final feliz, pois minha controladora eu não mais quis, e minha anja, essa beldade que me apareceu do nada, me beijou e me enroscou com suas asas.
Seguro eu estava em suas asas a refletir; e assim como esse novo cenário, pude então florir.

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